A caneca ao meu lado ainda está morna. O chocolate quente resiste bravamente a criação de nata. No meu celular ela digita. Há tempos - meses, anos? - não nos falávamos.
Ela mudou.
Não sei se fisicamente, nunca mais a vi. Talvez em ideia. Eu também mudei - a quanto tempo não escrevo?
Como personagem dos quadrinhos deprimentes: é assim que eu me vejo. Minha vida passa em preto e branco. São sorrisos falsos. São alegrias tristes. Há anos.
Lembro-me de como conseguia escrever. A minha verve não é mais a mesma. Tornei-me superficial. Em tempos outros, escrevi loucuras cheias de sentido. Hoje escrevo com uma sensatez vazia.
Tornei-me decrépito. Não em idade, mas em esperanças.
Ela - que permanece ali, na telinha do celular - tem uma melancolia que me faz lembrar a mim mesmo. Sou um narcisista da minha própria desgraça. Um contador de vantagem dos fracassos. Um competidor de malogros.
Tudo o que eu escrevo tornou-se bobagem. Minha complexidade tornou-se simplória. Sou um escritor de diários adolescentes. Um colunista da idiotia.
Quando voltarei a criar personagens? Quando voltarei a inventar enredos? Quando terminarei aquela história - arquivada, como meus sonhos - que refletia os medos que tenho?
Eu não sei. Permaneço inerte.