ESCRITOS

sábado, 9 de janeiro de 2016

O Luto do Cronista

Ela morreu. 

Quando criança, às vezes, eu chegava da escola e lá estava ela, a conversar com a minha mãe sobre as coisas da vida. O café ficava em cima da mesa e o cheiro era bom.

A presença dela - não sei por qual motivo - me trazia paz. 

Era uma senhora com muitas dificuldades. Não tinha dinheiro. Vivia uma vida sofrida tendo que, muitas vezes, assumir a função de mãe dos seus netos. 

Lembro-me vagamente de algumas vezes em que a minha mãe comprou pão e levou para ela em casa. Eu ia junto. Elas conversavam. O café ficava em cima da mesa. O cheiro era bom. 

Eu cresci. Ela me viu crescer. Quase me esqueci de escrever: as duas - ela e minha mãe - foram faxineiras juntas, na antiga empresa do "seu" Sérgio - o sujeito que deu um emprego para a minha mãe, mesmo ela não sabendo ler e escrever. 

Na última vez que a vi, pude ver as suas lágrimas ao saber da morte do mesmo "seu" Sérgio. Ela tinha muito amor no coração. 

De uns tempos para cá ela deixou de aparecer aqui em casa. Mesmo com as intempéries da vida - ela mudou de cidade, sempre perseguida pelas dificuldades financeiras - ela sempre viera nos visitar. 

Achamos estranho - eu e minha mãe - a ausência dela por tanto tempo. Procuramos. Tentamos telefones. Nada. 

Hoje a minha mãe me disse que encontrou outra amiga dos tempos de outrora. Perguntou sobre ela. "Morta há dois anos", foi o que ouviu.

Parte da minha infância morre com ela. As lágrimas não vertem em meus olhos - desaprendi a chorar - mas vertem em outras camadas de mim. 

Na minha infância a sua presença me trazia paz. Espero que onde estiver você possa sentir a mesma paz que há tempos me proporcionou. 

Descanse Célia. 

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